3.12.09

Testemunho de Isabel Botelho, fundadora da Associação Inês Botelho

Quando é que foi detectado o cancro na Inês?
A Inês andava com febres que não passavam , iam e vinham...supostamente seria mais uma "virose" da época. No dia 25 de Dezembro, como não passavam as febres e a conselho do pediatra, decidimos fazer uma análise para ver o que se passava. Foi nesse dia de Natal que nos disseram, no Hospital de Santa Maria, que a Inês tinha uma leucemia. Como podem imaginar foi o pior da nossa vida. Depois, foi o início do pesadelo. Foi transferida para o IPO, onde fez punção lombar para diagnosticarem que tipo de leucemia seria. Começou logo a fazer quimioterapia nesse mesmo dia e só da primeira vez permaneceu isolada num quarto por quase 3 meses sem poder receber visitas.

Como é que a Inês recebeu a notícia ?
Muito mal. Estava em casa a festejar o Natal e ficou toda aborrecida por irmos fazer análises nesse dia. Quando soube que não voltaria para casa mas que ia ser transferida de hospital e ia ver-se rodeada de pessoas de bata e máscara, inclusivé a própria Mãe...Podem fazer uma pequena ideia da revolta que se apoderou dela! Queria voltar para casa para junto dos primos para continuar a festejar o Natal ... além do sofrimento das picadas de agulhas.

Depois quando chegámos, reagiu novamente muito mal quando a médica lhe explicou tudo sobre os tratamentos e que ia perder o cabelo.
Foi dramático e custa-me sempre muito lembrar esse dia. Estávamos a 31 Dezembro, os foguetes do fogo de artificio, os tachos, a algazarra toda lá fora, e a minha filha lavada em lágrimas e cheia de dores dos tratamentos. Não queria sair do quarto, não queria ver ninguém. Estava destroçada! Ela adorava a escola e não podia ir, adorava arranjar-se para ir ter com as amiguinhas e não podia ir....ia perder o cabelinho que ela tanto gostava..etc...etc..

Passados uns dias, houve uma transformação. Com muito cuidado, fui tentando que ela percebesse que tínhamos de reagir, de colaborar, que estávamos ao lado dela e que o mau momento ia passar e que tinhamos de ir à luta!
E foi o que ela fez, corajosa até não poder mais, sempre colaborante com médicos e enfermeiros, fez tudo o que lhes possa passar pela cabeça. Foi mil vezes ao bloco operatório, colocou dois cateteres e esteve seis vezes nos cuidados intensivos do Hospital D. Estefãnea (a primeira, apenas quinze dias depois de lhe terem diagnosticado a doença onde entrou com uma pneumonia no dia 16 de Janeiro, em estado muito grave ! Fez todos os tratamentos de quimio possíveis, até um que mandámos vir de França em desespero. Fez radioterapia, fez dois transplantes, enfim, um calvário mesmo.

Nunca baixou os braços, mesmo muito fraca com os tratamentos violentos, nunca deixou de estudar. Os professores traziam me as fichas do Colégio para ela fazer e depois eu entregava. Quando ela podia ir para casa, mesmo muito fraquinha, a Directora de turma dela vinha a nossa casa fazer-lhe os testes e ela fazia.
Como não comia, teve de ser alimentada com uma sonda no nariz. Apesar disso continuava a fazer os trabalhos da escola e passou sempre de ano, uma verdadeira lutadora! E sempre, sempre com um sorriso que iluminava tudo e todos à sua volta!

De quem é que partiu a ideia de fundar a associação?
A ideia da Associação começou primeiro com o desejo de organizar um concerto em homenagem à Inês e cujos fundos iriam reverter para uma causa semelhante. Mas houve uma médica que nos disse que tínhamos tido, nós e sobretudo a Inês, uma atitude nunca vista, que tínhamos muito para partilhar, que podíamos ajudar com a nossa experiência, e lançou-nos o desafio de criar uma associação.
Assim, começámos a convidar médicos, enfermeiros, pais que partilharam connosco aqueles corredores, colegas, amigos, e assim nasceu a Associação Inês Botelho.

Foi fácil arranjar os apoios? Mostraram-se sempre disponíveis?
Posso dizer que nós não temos "dinheiro" e vamos conseguindo fazer o que fazemos com a colaboração das entidades envolvidas..
Por exemplo se planeamos um passeio, conseguimos quem ofereça transporte, ou se convidamos para um almoço, é porque conseguimos sensibilizar um restaurante para o oferecer. Vamos batendo a portas e assim conseguimos os apoios.
Posso dizer que tenho sempre sido muito bem recebida por todas as pessoas e entidades que tenho abordado. Fficam muito sensibilizados e ajudam.

Em que consiste o trabalho na instituição? Que tipo de actividades é que praticam? Estas actividades estão só direccionadas para crianças ou também para adultos?
Tentamos tornar o dia a dia das crianças atingidas com cancro e os seus familiares menos penoso.
Organizamos visitas aos meninos que estão internados, de ídolos, jogadores de futebol, marionetas, artistas, enfim tudo o que possa distraí-los e animá-los um pouco, para terem mais força para continuarem os seus tratamentos.

Por outro lado, organizamos saídas para os meninos que estão em ambulatório, ou seja, que só vão ao IPO para fazer tratamento, mas que voltam para casa. Fazemos passeios, pic -nics, jantares, levamos os meninos a estúdios de televisão para assistirem ao vivo a gravações. Tudo isso podem ver nos eventos que estão no nosso Site. Nessas saídas levamos também irmãos e pais, pois isso permite juntar a família que está separada quando os meninos estão internados. (ainda hoje estive no IPO a afixar uma ida à Kidzania no Sábado, 21/11).

Temos também um trabalho muito importante de sensibilização para dádiva de sangue e de as pessoas se inscreverem para dadores de medula. O nosso filho tem tido um papel muito importante nessa divulgação junto dos jovens.

Quantos voluntários é que fazem parte da associação? São principalmente pais de crianças que já passaram pelo mesmo?
Voluntários são bastantes, mas como somos muito jovens, a AIB tem apenas 2 anos, ainda não temos isso quantificado, mas somos bastantes.

Respondendo à sua pergunta, não, os voluntários não são pais, são voluntários que vão surgindo ao tomarem conhecimento da AIB. Por exemplo, uma empresa que serve refeiçoes, a quem nós solicitamos o serviço, quase sempre se oferecem para ser voluntários e querem fazer actividades connosco, querem envolver-se. São também muitos jovens que se vão juntando ao nosso filho.

Além dos donativos, como é que as outras pessoas podem ajudar?
Além dos donativos, as pessoas podem-se tornar sócios mediante o pagamento de uma quota simbólica. Podem oferecer serviços, dar ideias, mas mais uma vez, tudo isso está explicado no nosso site, se precisarem.

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